segunda-feira, 23 de maio de 2016

Da escola à vida e de volta...

Quem diria que até dar aula pode me ajuda no auto conhecimento! Nas últimas aulas levei esta dinâmica para debater meritocracia, já que estamos num momento decisivo de perda de direitos para discutir o tema. Tinha também produzido uma página de perguntas para ajudá-los a refletir (é, na educação aprendi que nossa atividade perguntadeira de jornalistas era uma habilidade). Nem todos vão pra zona reflexiva que queremos, mas os dois que disseram:
- Nossa se já está difícil pra nós imagine pros negros, gays...
Ou:
- Se perdermos o pouco que temos, lutarei feito Marighella!
Isso dentro de arte com a intenção de se por no lugar do outro, usar o corpo que vive sentado demais copiando ou escrevendo noutras aulas, enfim. Também explorei estes quadrinhos que deixam explícita a falácia da meritocracia.
Depois de levá-los à quadra, ver o vídeo da dinâmica feita com outros jovens, discutir e conferir os quadrinhos por dias, finalmente comecei a extensão universitária Tô No Rumo (sobre orientação vocacional) da Ação Educativa com a UFABC, que já tinha iniciado, mas tive problema nas primeiras aulas. Procurando meu bloco e sala, me toquei que nunca tinha feito nada em "facu" pública. E que de certa forma, me convenceram que era inviável, pois a maioria dos cursos tinham horários picados, "quebrando a perna" dos que tinham que trabalhar. Só prestei USP uma mísera vez, embora tenha repetido a dose de cursinho vertibular. Talvez fosse isso esse perrengue mesmo há 20 anos, já que não tínhamos ENEM, ProUni e o FIES era bem difícil (um colega de fora de São Paulo, ainda mais apertado que nós, não conseguiu). Estas pontes do trabalho à vida são sacadas que mexem comigo.
Vivenciado a arte de narrar
Em meu dia de mergulhar na paixão da "contação" de histórias tivemos aula da pós no festival internacional de histórias Boca do Céu. Além de me encantar com a colombiana Carolina Rueda, novas músicas e ampliar o repertório de contos, caí de amores (junto com meus colegas de turma da Casa Tombada) pela moçambicana Lenna Bahule: a única a criticar ludicamente a tentativa da mídia "nos por em nosso lugar" com a nota "bela, recatada e do lar" e se posicionar politicamente "volta querida". Já a maioria dos demais, se aferraram à tradição popular brasileira, que nesta altura do campeonato tem nos parecido machista e para algumas até racista. É que temos estudado e discutido A Renovação do Conto de Maria Patrini e não temos nos conformado daqui esta arte ainda não ter se reinventado.
Novo Ney
Consegui dois milagres neste final de semana: selecionar a duras penas um único show da Virada Cultural (emputeço se fico correndo dum palco ao outro, ouvindo um pouco de tudo e muito de nada) e ainda por cima arrastar as primas do ABC que pagam para não sair "do interior"... Fomos ver Liniker e bancamos as tietes retardatárias. Ainda não tinha conferido atração nenhuma do lado de fora do Sesc Pinheiros e menos ainda atrás do palco. Ele me pareceu um Ney Matogrosso jovem e ainda mais arrojado. Ainda não assisti Ney, mas "de vez em sempre" sei que minhas tias veem de novo e se rasgam de novo e de novo por este artista que vai muito além da música. Acho que a diferença é que o Liniker também circula para além do palco toda montada. Mas que graça conferir quem ainda não estrelou não? Teve uma Virada que fiz isso com A Banda Mais Bonita da Cidade, mas eles já não respondem mensagem de Face. O Liniker não, saiu tirando foto com Deus e o mundo! Ainda por cima dança pra caramba, brinca com as backing vocals, explora tão inventivamente maquiagem, figurino, acessório... Como ex repórter inveterada voltei conferindo outros vídeos que não conhecia dele e apurei: é da terra de alguns dos primos mais criativos (Araraquara, de onde também vem Ignácio Loyola Brandão), é da trupe (estudou na Escola Livre de Teatro de Santo André) e um bebê: só tem 20 anos. Mas está aí inspirando quebra de padrões e aceitação dos fãs diferentões que deve ter. Faz uma música corta pulsos chiclete que é mega canceriana, passamos horas cantando e como disse um fã na web "o som dele transa com a gente". Como se não bastasse, vários momentos virou um manifestashow: "fora Temer", "ai, ai, ai empurra o Temer que ele cai"!
Só sei que esta nossa representação brazuca soul é uma paixãozinha e como diria outra amiga da educação e comunicação muito mais militante "mais uma prova de que a nova geração arrebentará".

terça-feira, 17 de maio de 2016

O Otimismo é a Única Opção

Vivenciar o misto de militância-cultura-feminismo borbulhar nas veias. Esta foi a experiência de acompanhar o bloco percussivo feminino Ilu Obá de Min com as baianas da Vai Vai na Bela Vista. A bandeira exigindo os ministérios extintos de volta. A prosa com a amiga prima adotiva "tudo que nos restou é resistir na esperança". Uma professora dela ensinou que o otimismo é revolucionário. Ainda mais em tempos politicamente sombrios...
Ganhei meia bolsa para aprender algumas técnicas do Romanovsky: o que pode ser mais revolucionário que a generosidade nesta temporada de crise? Recebendo esta terapia corporal de liberação emocional, senti que os pontos pressionados na barriga tiveram a ver com romper tardiamente o cordão umbilical da relação passional demais com minha mãe. Rolou um choro, mas depois a alegria era tããããão intensa! E aquela curiosidade "gente, o que pode ser a vida sem tensão"? Vontade danada de reverberar o que abençoadamente ganhamos! Ser multiplicadora é uma rebeldia com causa!
Uma antiga estudante, que só Buda sabe como criamos laços em meio ao caos de dar aula na várzea do Estado, me procurou receosa pois já haviam expulsado alunos de outras ocupações nas escolas de São Paulo, sem mandato de posse, obviamente com violência, sem deixarem fazer corpo de delito e estava com medo devido à polícia na porta (porque será que em boca ou quebradas piores eles não intimidam assim hã?) e a diretoria contra. Explorei minha experiência contatando todas mídias alternativas possíveis, engolindo indignação emotica, incentivando que os adolescentes é que estão nos fazendo acreditar na gestação do mundo novo e cantando Legião com voz embargada: "é o bem contra o mal/ e você de que lado está/ estou do lado do bem/ e você de que lado está? (...) com a luz e com os anjos/ mataram um menino/ tinha arma de verdade (...)".
É como se a leitura das biografias da Pagu, Chiquinha Gonzaga, Iara Iavelberg, Anita Garibaldi, Olga Benário e Rosa Luxemburgo e as passeatas pelas mulheres, pela paz e contra o aumento das passagens finalmente descessem do mental ao coração. Um pertencimento inenarrável, como diria um locutor exagerado como eu. Uma razão de ser que dá força que estamos precisando neste momento crítico.
Revendo minha ex estagiária, meu primeiro ensaio para professora, quando a ouvi reclamar da "corporativolândia" não tem jeito, é assim, não me aguentei:
- Tem sim, sempre terá! A gente se apega a comer sendo bem servida como aqui, mas não podemos achar que a vida é esse raso inebriante. Sem querer estes dias contabilizei uma dúzia de economias da assessoria de comunicação ao magistério. Mas ouvir que tinha um texto bom ou fazia uma boa divulgação lá, era só um trabalho bem feito. Conseguir fazer meus alunos criarem, ensaiarem, fazer jogo teatral, ajudar uma aluna, saber que a gestão reconheceu que trabalho com amor... É uma razão de ser, uma militância educacional. É querer estudar nas horas vagas, nos formar pra além da sala de aula.
Dei uns desafiozinhos pra ela começar um desmame do quanto a opressão corporativa nos faz crer que é isso mesmo, não tem saída...
Em meio ao programa de coaching, auto conhecimento e empreendedorimo que tenho feito virtualmente, a missão que tanto discutimos online que precisamos encontrar fez um "poim" na minha cabeça. O dia fica lindo, a gente quer chorar, esparramar este sentido ao planeta terra... Eu sei, para quem sempre tirou sarro das abordagens "podicrê" demais, soa estranho... Mas sem que nos trabalhemos pra chegar aí nesse centro de nós mesmos, é difícil por em palavras. Como explicar a quem faz passeata pelo ódio o pertencimento de quem marcha junto pelo amor. Não é cerebral mesmo, é passional demais pra racionalizar...
Fechando com chavinha de ouro estes últimos dias em que não uma ficha, mas um cassino inteiro caiu, estava voltando da médica ouvindo no elevador funcionários do prédio de consultórios reclamarem que só tinha feriado semana que vem e não aguentei:
- Gente, vocês precisam de outro trabalho!
A militância amorosa com propósito precisa ser disseminada de cima abaixo, da direita à esquerda.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Do Diário de Bordo que Me Devo Desde a Faculdade de Teatro

Quando assumi que desde que me meti nas coxias não consegui meu coração de volta, um de meus diretores ensinou o Diário de Bordo. Tentei fazê-lo algumas vezes, mas alguma crise com o personagem, um pé dentro e outro fora do jornalismo ou deprê me impediram de continuar. Resolvi retomar virtualmente a empreitada pois dou aulas três vezes por semana e abençoadamente faço a formação em teatro do oprimido da prefeitura, a pós em contação de histórias da Facon pela Casa Tombada e farei
extensão das dinâmicas para orientação profissional ao jovem do programa Tô No Rumo da Ação Educativa pela Federal do ABC. A pós vive nos fazendo voltar para casa procurando um "chão literário pra chamar de nosso", mas sempre sabendo que quando encontramos, não funciona com todos os públicos e em todos os espaços - já que criação é sempre essa matéria prima fugaz e inebriante. Na formação em TO reencontrei o professor que tentei estudar anos atrás na ocupação do centro antigo de São Paulo, mas o cansaço de trabalhar a 4 horas de casa, dez horas por dia ma biblioteca do Colégio Santa Maria
acabava me fazendo voltar pra exausta e dormir quase sempre acabada. "Agora não Pantaleão", parafraseando um personagem de Commedia Dell Arte. Tem me feito tão beeeeem! Nesta semana no exercício de criarmos uma viagem com sons e movimentando o parceiro na dupla de olhos fechados, levei o colega pruma floresta, mas confirmei que se não enxergar o que imagino, meu colega também não voa longe (nesta altura do campeonato é até difícil resgatar se a "contação" ou o próprio teatro me trouxe
isso). Fazendo com o corpo o que realizávamos naquela hora do dia em que os professores sugeriam não aguentei quando um colega foi mostrando que não faz muito trabalho doméstico (nossas expressões corporais nos levaram pruma discussão de gênero):
- Com quem você mora?! - estranhei (ah, a feminista que carrego pra cima e pra baixo não se resigna a passar desapercebido). Me denunciei fazendo vários movimentos de costas... Sei lá porque catzo!
Completamos com o bom e velho campo minado: esparramando sapatos pelo chão, colega vinha de
olhos fechados, cantávamos baixinho se ele estivesse longe dos obstáculos, mas se aproximasse fazíamos um escândalo! Se por acaso encostasse na "mina" aproveitava para explodir cenicamente. Ou seja o exercício era delícia de ponta a ponta. Depois deitamos, desenhamos de olhos fechados, nomeamos a imagem que criamos intuitivamente, da primeira palavra fomos poeticamente para outras até desaguarmos num poema e então fomos encontrando movimentos solo para nossa poesia até que conseguimos cruzar essas danças poéticas. Da primeira "tranquilidade" cheguei a "abraçada pela maresia/ aconchegada pelo sol/ entregue à marola". Voltei tããão animada, fiquei contando ao namorido, cismei de levar às salas, ele foi realista "nós gostamos por curtir essas propostas". Na primeira noite, descobri que um dos alunos passou por oficinas do Agente Jovem, aprendeu teatro e composição lá e é educador dessa iniciativa. Ele me ajudou pois inicialmente os estudantes estavam mais arredios, então fizemos a roda em que nos atentamos aos parceiros que estão de um lado e de outro, descruzamos as mãos, andamos pelo espaço, paramos, buscamos as mãos dos colegamos que tínhamos ao lado, viramos uma corrente e vamos desenroscando sem soltar as mãos até voltarmos ao círculo. Se divertiram lá no pátio da escola. Tentei fazer a Hora do Dia em roda que foi como encerramos discutindo, mas já estavam a meio mastro, loucos pelo intervalo. Já na turma com mais senhores depois, cada exercício foi um pequeno grupinho que tentou, mas acabaram criando a viagem que dei de exemplo no ouvido dos amigos, então não sei bem onde foi parar a criatividade deles. Voltei "cabreira": claro que estudo também por mim, mas se não consigo reverberar, de que vale? Nesta quinta revi com outros estudantes o que tinha experimentado teatralmente com o professor de português, que incentivou cenas antes do feriado... E nós lá com a demanda de apresentar algo na semana que vem, porque virá o pessoal do projeto Quem Ama Abraça e queremos mostrar o que temos incentivado nesta discussão de violência contra mulher. As cenas deles eram até bacanas, mas devido ao improvido e pouco ensaio, se atropelavam nas falas. "Tirei da cartola" a cena de várias violências no ônibus explorada semestre retrasado num projeto de outro colégio, escrevi na lousa, ensaiamos, dei algumas direcionadas e o professor parceiro ficou de ajudá-los semana que vem, já que apresentarão em dia que não tenho aulas. Encomendei fotos ao colega da secretaria e saí entendendo que militância é essa dentro do ensino público, afinal não pude comparecer à passeata que me chamaram virtualmente contra o famigerado golpe. Também tem luta pra cá das trincheiras! 
P.S.: Priorizo as fotos das aulas de teatro do oprimido aos registros do colégio pois esta semana a formação livre deu tanto "ziriguidum" que troquei muito com os professores, ganhei música pra cantar ao namorado pois fiz mímica andando de moto, relembramos as cenas e poesias que nos tocaram pelo caminho (recordei lá da contação do Sagrado Feminino na Cirandha da Lua, mas vindo lembrei das crianças chorando no Shakespeare Apaixonado, das discussões que rendiam no teatro de rua do abrigo Arsenal da Esperança e a menina dizendo que a contação no Teatro Real tinha sido tão bonita e eu engolindo choro). Também saí com a pulga atrás da orelha porque o professor contou que disseram na tese dele que a arte em projeto social ou prepara o indivíduo para a exigência da criatividade no mercado de trabalho ou acalma os ânimos dos que não se encaixam (ai, tão eu).
P.S.2: O colunista Mainardi, que saiu do Brasil, mas o país não saiu dele, escreveu numa Veja criticando provavelmente os feitos culturais e/ou sociais das últimas gestões petistas: "o que eles querem? Teatro do oprimido em todas as esquinas como em Santo André"? Não Diego ainda faremos no quintal de sua casa: já praticamos em 70 países do mundo! Nos aguarde!