terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Aspirante a Professora à Espreita

Foi num fim de tarde chuvoso. O pessoal do Espaço de Leitura, como sempre, apostou que o sol seguiria a todo vapor. Nós aqui à espreita já tínhamos nos tocado que aquele calor seria debandado pela chuva de verão de sempre. Mas artistas são tão otimistas! É o movimento de sempre: um calor em que todos eles ficam quase de língua de fora e então... Nuvens, trovões, chuva de verão... Há anos. Eles não aprendem. Chega a ser divertido.
Mas naquela tarde, vieram vários se apresentar. Uns de ponta cabeça, outros dobrando papeis e os demais... Bem, os outros não acompanhamos tão de perto, já que correram para as casinhas literárias do parque e as lotaram de tal forma que foi difícil para nós encontrar algum espaço entre eles. Ouvimos umas risadas, músicas, mas nos chamou atenção o último que foi bem enfático no final:
- Ocupamos o Espaço para ele não fechar, podem terceirizar o parque...
Não tenho muita certeza do que seja terceirizar, mas fechar o parque, certamente não é bom. Perguntei aos outros moradores daqui, que às vezes passam batido pelos que vêm correr, comer ou tirar fotos e foi a mais antiga de nós quem confirmou:
- Há um movimento para que empresas cuidem dos parques, cobrem e possivelmente sucateiem as áreas verdes.
- Caramba! Já não temos muitas! Soubemos de colegas criar casas entre as luzes vermelha e verde dos farois! É preciso fazer algo!
- Uma turma que estuda ali do outro lado da rua discute isso também. Já viu como aquela casa histórica do lado de lá mudou os ares nos últimos tempos?
Não tinha reparado. A maioria de nós come, dorme, vai dum lado ao outro... Mas aqui entre o verde mesmo. E se ele faltar? Pensando bem, melhor conhecer essa turma da tal casa histórica. Quem sabe o que eles conversam nos ajuda e...
Bem, quem não circulava fora do Parque da Água Branca teve que aprender né? Nada como uma observação atenta! Conferi os vira latas esperando os carros pararem, desconfiando inclusive das luzes vermelhas parando os automóveis, mas nem sempre... E lá fui eu cruzar a rua junto com os tomba latas da região.
A tal casa histórica aumentou. Quando começamos a por reparo só uma dela reunia os preocupados com a tal terceirização do parque. Vi reformarem a casa vizinha. falarem de escola sem partido, contação de histórias, arte educação, percurso na educação... Mais um pouco eu podia me formar entre eles.
Foi quando me vi meio inchada. Precisando ficar no meu canto. E o pessoal discutindo, reformando, ligando, ensaiando. Tivesse a voz tão incisiva quanto eles e pedia mais tranquilidade, ao menos por um tempo, mas que gene agitada circula lá! Achei um cantinho menos agitado entre as casas históricas. Pouco tempo depois e... nasceram meus ovinhos! Choquei tantos que me espantei: não imaginava que viessem tantos! Quando nasceram... Caramba, devem ter puxado o pai! Nenhum moreno chamando atenção como eu. Aí sim, tive que me resguardar, afinal, tão pequenos, podem sair por aí, se perder, serem pisados... Nem sabem voar ainda! Não que sejamos capazes de voos rasantes admiráveis, mas o mínimo para nos defender, sim. Porém cismei que este ambiente de estudo, discussão, reforma, ensaio, risadas pode ser um pouco perigoso para eles. Afinal esse pessoal raramente olha o chão! Também achei justo procurar o pai e revelar que todos puxaram as penas branquinhas dele. Mas comecei gostar destas liçõezinhas que comecei a ter por aqui. Quis compartilhar com os patos, corujas, todo mundo do Parque. Agora virei nômade. Fico um pouco aqui, volto ao Parque, convoco a bicharada, vários reclamam que não querem fazer assembleia, que a política está meio desacreditada... Mas quando peço ajuda com os pintinhos e aviso que será uma aula resumida do que tenho ouvido infiltrada na tal Casa Tombada do outro lado da rua, vejo muitos se aproximando mais curiosos, já que ainda não tinha descoberto o que tem movimentado as casinhas históricas do lado de lá. Às vezes também "toco o terror":
- Se não entendermos com eles como defender o Parque, vocês serão os próximos a morar entre um farol e outro, como nossos colegas que voaram para o centro antigo!
É quando o resto deixa de procurar comida, nadar e vem escutar o que tenho aprendido de literatura, educação e arte do outro lado da rua. Uns desconfiam que não é por este caminho que nos defenderemos e ainda não sabemos como resguardar o Parque da tal terceirização. A confiança dos professores e artistas do lado de lá tem me contaminado e estou buscando fazer o mesmo com os companheiros do Parque.
Quem sabe juntando a bicharada aos estudantes e professores aqui do lado descobrimos juntos?

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